sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Tradução de um dos materiais distribuídos pelo Dr. Brian Iwata no evento ESPCA Autism, ocorrido em São Carlos de 9 a 13 de Janeiro de 2012

Análise Funcional de Comportamentos Auto-Lesivos ou de Transtornos de Comportamento Relacionados


Noção Geral:

Lógica: A avaliação expõe o cliente a condições que podem estabelecer a ocasião para comportamentos auto-lesivos. Essas condições são baseadas em anos de pesquisa indicando que reforçamento positivo ou negativo (tanto social quanto automático) são conseqüências que mantêm comportamentos auto-lesivos. Por meio da identificação de quais fontes de reforçamento são responsáveis pelo problema de comportamento do cliente, programas individualizados de tratamento podem ser desenvolvidos.

Proteção contra riscos: Embora a proteção do cliente seja de primária importância, é melhor que equipamentos de proteção sejam utilizados o menos possível durante a avaliação. Se o risco físico é uma preocupação, obtenha um critério de finalização da sessão do pessoal médico. Se o comportamento é severo a ponto de todas as ocorrências deverem ser bloqueadas, a pessoa não é indicada para participação em uma análise funcional. Encaminhe tais indivíduos para consulta ou participação em procedimentos modificados de avaliação.

Consentimento informado: É importante que se garanta que pais, responsáveis e membros da equipe interdisciplinar compreendam o propósito da avaliação e aprovem sua utilização.

Medicação: É ideal que seja conduzida a avaliação na ausência de medicação psicotrópica. Se isso não for possível, o nível de medicação deve ser mantido constante até que a avaliação seja completada.

Local das sessões: Escolha uma sala afastada de atividades em andamento. É preferível uma sala com um espelho falso. Se não houver disponível, observadores devem permanecer afastados do cliente e evitar contato visual ou interação de qualquer tipo.

Duração das sessões: As sessões normalmente duram 10 minutos, a menos que o critério de finalização seja alcançado, e são marcadas com um cronômetro (normalmente são realizadas de 40 a 60 sessões).

Comportamento-alvo: É o comportamento que é registrado por observadores e que recebe conseqüências de um terapeuta nas condições de demanda e de atenção. Sob a maioria das circunstâncias, cada ocorrência do comportamento-alvo será registrada.

Terapeuta: É o indivíduo que interage com o cliente como especificado abaixo. O ideal é que um terapeuta diferente esteja associado com cada uma das condições abaixo (por exemplo, um terapeuta conduz todas as sessões de atenção, outro conduz todas as sessões de demanda etc.). Se um único terapeuta conduz todas as sessões, será aconselhável que ele vista uma camisa de cor diferente ao conduzir cada tipo de sessão.

Condição sozinho
Propóstito: Esta é uma condição de teste para reforçamento automático. Se o comportamento ocorre a uma taxa alta na ausência de interação social, é provável que ele produza seus próprios reforçadores (como na auto-estimulação).
Condições antecedentes: Nenhum terapeuta é necessário para essa condição, ou, se um está presente, nenhuma interação social ocorre. O quarto não deve conter brinquedos, materiais de lazer ou reforçadores.
Conseqüência: Não há conseqüências sociais para o comportamento (por exemplo, nenhum comentário ou mudanças de expressões faciais).

Condição de atenção
Propósito: Esta é uma condição de teste para reforçamento positivo social. Se a taxa de um comportamento-alvo é maior nesta condição do que em outras, é provável que o comportamento seja mantido por atenção como conseqüência.
Condições antecedentes: O quarto deve conter alguns brinquedos ou materiais de lazer, os quais estão livremente disponíveis durante a sessão. As sessões começam com o terapeuta declarando que deve fazer alguma tarefa, ler o jornal, conversar com um colega etc. (isto é, não atender o cliente). Deste ponto em diante, o terapeuta não interage com o cliente a menos que o comportamento-alvo ocorra.
Conseqüência: Em seguida a cada ocorrência de um comportamento-alvo, o terapeuta se aproxima do cliente e faz uma afirmação de preocupação, que pode ser pareada com um breve contato físico. Por exemplo, enquanto diz “Não faça isso, você pode se machucar”, o terapeuta pode também gentilmente segurar o braço do cliente, afagar suas costas em um movimento para acalmá-lo, ou mesmo olhar e apontar para o local do corpo que foi alvo do comportamento auto-lesivo. Estas interações devem durar em torno de 5-10 segundos. Se o cliente continua a se engajar no comportamento durante a interação, esta deve também continuar.

Condição de diversão
Propósito: Esta condição é um controle para as outras três condições de teste, porque o cliente não está sozinho, atenção está disponível e tarefas não são apresentadas. Como resultado, o comportamento-alvo deve ocorrer menos frequentemente nesta condição. Se o comportamento-alvo ocorre em uma taxa alta nesta condição, é possível que o comportamento produza seus próprios reforçadores e que as atividades alternativas não compitam com o comportamento-problema. Se o comportamento-problema é alto na condição diversão e também alto na condição de demanda, é possível que seja mantido por fuga de interações sociais em geral.
Condições antecedentes: A sala deve conter brinquedos, materiais de lazer e reforçadores conhecidos. O cliente deve ter acesso livre aos itens. A intervalos de 30 segundos o terapeuta deve responder a qualquer comportamento social apropriado iniciado pelo cliente.
Conseqüência: Não há conseqüências para comportamentos-problema, exceto que a atenção deve ser atrasada se o comportamento-problema ocorrer logo que a atenção esteja prestes a ser oferecida.

Condição de demanda
Propósito: Esta é uma condição de teste para reforçamento negativo social. Se um comportamento-alvo ocorre mais frequentemente nesta condição, é provável que o comportamento seja mantido por fuga de demandas de tarefas.
Condições antecedentes: O terapeuta inicia a sessão apresentando uma demanda de tarefa relevante (educacional, vocacional, auto-cuidado etc.) ao cliente. Por exemplo, “penteie seu cabelo” ou “hora de trabalhar”. Se o cliente não colabora depois de 5 segundos, o terapeuta demonstra a resposta correta (ou fornece uma dica física). Se o cliente não colabora dentro de 5 segundos a partir da dica, o terapeuta guia fisicamente o cliente para realizar a tarefa. Estas tentativas de instrução são repetidas até que a sessão termine. Normalmente é melhor que seja apresentada uma variedade de tarefas, mas que sejam incluídas quaisquer tarefas que se suspeite serem desagradáveis para o cliente. Nenhuma outra interação entre terapeuta e cliente deve ter lugar.
Conseqüência: Em seguida a cada ocorrência de um comportamento-alvo, a tentativa de instrução (demanda) é imediatamente terminada sem comentários do terapeuta, e a próxima tentativa é adiada por cerca de 30 segundos.

Outras considerações
Seqüência das condições: As condições de avaliação normalmente são apresentadas em uma seqüência fixada na seguinte ordem: sozinho, atenção, diversão e demanda. Sempre que possível, é recomendável que se mantenham terapeuta, locais e materiais constantes em cada condição (por exemplo, o mesmo terapeuta, local e materiais são usados em todas as sessões de diversão) para facilitar a discriminação dentre as condições de avaliação. Clientes ocasionalmente podem não discriminar muito bem as diferentes condições, o que pode produzir resultados duvidosos. Assim, dois arranjos alternativos são possíveis. No delineamento reverso, uma única condição (por exemplo, sozinho) é continuada até que os dados se mostrem estáveis; então a próxima condição (por exemplo, atenção) é introduzida, e assim por diante. A outra alternativa é a avaliação em pares, na qual uma condição de teste (por exemplo, atenção) é alternada com o controle (diversão), seguida por outro par teste-controle (demanda vs. diversão) etc.
Outras condições: As condições acima representam uma configuração geral de “sondagens” de avaliação que simulam o ambiente natural. Alguns clientes têm histórias incomuns que podem requerer modificações nas condições acima ou a adição de novas condições. Por exemplo, um indivíduo cujo comportamento-problema seja mantido por atenção pode exibir esse comportamento apenas se outra pessoa (um colega) estiver recebendo atenção. Outro pode exibir o comportamento-problema para fugir de algumas tarefas (por exemplo, auto-cuidado), mas não de outras. Se os dados da avaliação inicial não são claros, a consistência de implementação foi verificada e as condições foram tentadas utilizando-se o delineamento reverso, devem-se considerar alterações sistemáticas das condições de avaliação.

Variações no formato da avaliação
Análise Funcional Breve (Brief Functional Analysis – BFA): Se o tempo de avaliação é extremamente limitado (por exemplo, apenas uma parte de um dia está disponível), reduza a duração da sessão para 5 minutos e conduza quantas sessões o tempo permitir.
Análise Funcional de Latência (Latency Functional Analysis): Se o comportamento-problema é bastante severo e não se pode permitir que ocorra muito frequentemente, conduza sessões como descrito acima, mas finalize a sessão após a primeira ocorrência do comportamento-problema (após fornecer a conseqüência apropriada). Ao invés de contar o número de comportamentos que ocorrem, a medida será a latência desde o início da sessão até a primeira ocorrência do comportamento-problema (latências curtas do comportamento-problema em uma dada condição de teste indica a função).
Trial-Based Functional Analysis: Esta avaliação é mais útil quando se tenta conduzir uma avaliação durante atividades em andamento, como em ambientes de sala de aula. Ao invés de se conduzir “sessões”, sondagens breves são inseridas ao longo do dia. Cada sondagem consiste de um segmento controle de 2 minutos seguido por um segmento de teste de 2 minutos. (1) Demanda: Controle – professor próximo, mas tarefas não são apresentadas. Teste – professor apresenta tarefas como na condição de demanda. (2) Atenção: Controle – professor interage socialmente com o estudante. Teste – professor anda para longe e ignora o estudante. (3) Sozinho: períodos de 2 minutos durante os quais o estudante não tem acesso a atenção, tarefas etc. Conduza sessões por vários dias, registre se o comportamento-problema ocorre durante cada par de segmentos controle-teste, e depois adicione a proporção de ensaios de um dado tipo durante os quais o comportamento-problema ocorreu.